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Encontre a sua bússola para navegar os mares revoltos da parentalidade
Encontre a sua bússola para navegar os mares revoltos da parentalidade
Opinião | Marisa Alves, Psicóloga Clínica
Ser mãe/pai é muito desafiante. Por vezes é difícil perceber se se está a fazer a coisa certa. Para ajudar, encontre a sua bússola e deixe-se guiar.
“O que queres ser quando fores grande? Pai.” Era esta a resposta de um dos meus sobrinhos aos 5 anos de idade.
Além de ser uma resposta que nos arrancava sempre um sorriso, era uma afirmação que cabia nos seus cento e poucos centímetros de altura.
Porque afinal o que significa ser pai? Pode parecer uma pergunta fácil, mas a maior parte das pessoas vai gaguejar um pouco para a responder, principalmente à medida que entramos no que está para além da supressão de necessidades básicas ou dos direitos universais do ser humano.
Eu própria me pauso muitas vezes face a esta pergunta. Que mãe sou? E mais importante ainda - que mãe quero ser?
À primeira vista pode parecer um mero exercício teórico ou tema para um debate interessante, mas é muito mais do que isso. É dar sentido e significado a um dos papéis mais importantes e difíceis da nossa vida.
Esse papel implica, muitas vezes, proporcionar aos nossos filhos uma experiência muito diferente da que tivemos, com todo o suor e lágrimas que acarreta quebrar ciclos familiares, que se tendem a manter.
Quantas vezes já deu por si a dizer coisas que lhe disseram? A agir da mesma forma que agiram consigo?
Algumas vezes blindado de toda a consciência e orgulho dos valores que lhe foram passados, mas outras tantas de forma impulsiva e acompanhada de culpa ou irrefletida e sem rumo.
Sei que estaremos todos a fazer o nosso melhor, mas sei também que se tiver uma maior clareza sobre a mãe ou pai que quero ser, serei capaz de responder numa melhor versão de mim.
Se tiver uma bússola que me diga onde fica o Norte, não conseguirei controlar o mar, nem evitarei todas as tempestades, mas saberei para onde ir.
Se tiver consciência sobre a mãe/pai que quero ser, posso usar esse mapa para definir prioridades, para agir em nome do que valorizo ou para aceitar os dissabores da parentalidade, em vez de reagir automaticamente aos meus pensamentos, emoções e impulsos.
Esta questão surgiu-me ainda antes de ser mãe.
Quando pensava em estratégias clássicas como o time-out (em que é sugerido que a criança seja colocada sozinha num local sem distrações por alguns minutos para pensar no seu comportamento) e na forma como podiam conduzir os pais ao resultado desejado (a extinção de um determinado comportamento), falhando completamente no que sabia sobre desenvolvimento infantil, e até no que verdadeiramente procuravam as famílias que me pediam ajuda.
A maternidade trouxe a consciência vivida de como pode ser difícil não ficar preso aos resultados e às consequências, a crítica invisível dos outros e da nossa própria cabeça, quando enfrentamos um problema ou quando os filhos não correspondem às nossas expectativas – “Será que estou a fazer um bom trabalho? Será que fui feita para isto? Será que não estou a estragar esta criança”.
Isto é ainda mais verdade, quando existem tantas formas “de ser pai”, tantos pontos de partida diferentes (a minha experiência de educação, será certamente diferente da sua) e companheiros de viagem tão diversos (já que seremos sempre pais na medida dos nossos filhos).
Tantas impossibilidades de fazer uma pausa, de respirar fundo, de se dar o direito de não atender às muitas coisas de que os seus filhos precisam ou de colocar um dia de “férias”.
Tantas escolhas difíceis no equilíbrio entre a orientação que damos e o quanto permitimos que descubram por si, no quanto colocamos limites ou relaxamos…
No meio de tantas possibilidades e cruzamentos possíveis, é fácil seguir a onda de impulsos do nosso mundo interno, como quando gritamos por estarmos frustrados com os incumprimentos na rotina.
Difícil é suportar o calor ardente que pode vir com o pensamento “este miúdo está a ser um malcriado”, para o ajudar a encontrar formas adequadas de se expressar.
Tolerar a tensão que se forma quando pensamos que “está a ser egoísta”, para lhe dar a confiança necessária para lutar por aquilo que quer de forma cuidadosa com os outros.
Aguentar o aperto no peito quando lhe negamos algo não essencial, por saber que o vai ajudar a saber tolerar as frustrações da vida.
Por isso voltemos à questão, que mãe ou pai quer ser? Honesto, confiante, justo, caloroso… não há respostas certas.
Cada um deve decidir o que considera importante para que os seus filhos cresçam bem.
Como gostaria que falassem de si e da vossa relação aos amigos? Compreensão, flexibilidade, cuidado… não há registo de prova, o que valoriza com filhos pequenos, pode não ser o mesmo que vai priorizar quando entrarem na adolescência…
Mesmo que seja difícil responder de imediato, que saiba que se vai desiludir por falhar com eles ou que se sinta criticado e julgado por outros, abrace mais este desconforto, prometo que vale a pena.
Pare e responda regularmente a esta questão, como se fosse buscar a bussola várias vezes, para ter a certeza de que está a ir para o sítio certo, permitindo-se relembrar como quer agir.
Sim, porque mais do que responder à pergunta, trata-se de orientar o nosso comportamento em função da resposta, trata-se de agir como a mãe/pai que quero ser e não reagir como a irritação, a frustração ou a preocupação (ou todas em conjunto e misturadas aos trambolhões) me impelem.
Trata-se de criar um sentido de propósito e vitalidade que legitima as dificuldades da parentalidade e de agir de acordo com o que procuramos.
Alguém terá dito que “sermos pais é o que nos incita, na idade adulta, a sermos melhores pessoas”.
Não acho seja a única forma, mas admito que há uma energia que nos transcende no momento em somos convidados a ser parte tão determinante da vida de alguém, é preciso honrá-la, encontrando a nossa bússola, orientando para o Norte que pode ir mudando ao longo da vida e preparando-nos para falhar até ao fim, mas sempre na rota certa.
Psicóloga Clínica
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